

Quando eu me achava jogando pelada, no campinho da Rua do Apicum, na manhã de sábado de 30.10.1971, já sabia que não demoraria para acontecer uma versão de Guerra dos Mundos, na Rádio Difusora, pois o radialista Rayol Filho falou, na frente do Sobrado Maia, para diversas gerações, que o auge seria realizado no seu programa São Luís Hit Parade. Estão querendo uma audiência interplanetária, brinquei, ali, com Rayol Filho, que me chamava Beto Bom de Bola (título da famosa música com que o cantor e compositor paulista Sérgio Ricardo, no 3.º Festival da Record, em 1967, reagiu com irritação a uma vaia, e quebrou o seu violão e tirou o time dele campo, com a sentença, para o auditório, de “Vocês ganharam!”).
Aproveitando o ensejo, como acompanhei muitas conversações a respeito de momento raro e relevante da radiofonia maranhense, vou levando que, entre mortos e feridos, escaparam todos, no episódio de 30.10.1971, em comemoração ao aniversário da Rádio Difusora (aliás, o mais certo seria 29), quando o na época radialista da emissora, Sérgio Brito, inspirando-se no americano Orson Welles, resolveu expor, para São Luís ficar em transe, que estava havendo uma invasão alienígena, em nosso quintal, tudo com base na adaptação radiofônica do livro de ficção científica Guerra dos Mundos, de Herbert George Wells, tal e qual Welles havia feito na Rádio CBS, nos Estados Unidos, em 1938. Daí por que os ouvintes ludovicenses, desperados com o que escutavam, começaram a entrar em pânico, em decorrência da transmissão, que durou cerca de 1h30min, com o fechamento do comércio, em desabalada carreira, e colocando o exército brasileiro, sediado no 24.º BC, no João Paulo, de prontidão. Com a invasão marciana, já se comentava em todas as esquinas possíveis, significando um verdadeiro fim do mundo, tempos depois a Cidade veio a saber que, descoberta a farsa, Sérgio Brito e outros companheiros da RD não foram presos, porém a emissora ficou com os transmissores lacrados por três dias, diga-se de passagem, este e outros exageros disseminados, os quais o cronista vai tirar a prova dos noves com dois craques da estação radiofônica famosa, que estavam ali, inseridos no slogan que marcou época, “O fato aconteceu, é notícia na Difusora!”: Edy Garcia e José Rocha (Gojoba), nas próxiam edições do Sotaque da Ilha.
A estratégia de Sérgio Brito — Em consonância com o roteirista da Guerra dos Mundos maranhense, o primeiro passo foi a adaptação do roteiro para o Maranhão — na versão de Welles, os fatos se passam apenas nos Estados Unidos. “Acrescentei uma série de coisas que não constam nem no livro de Wells nem no programa de Welles”, contou Serjão, com a competência até em saber que um era Wells (escritor inglês, sem o e perto do s ) e o outro Welles (do gênio americano, com e antes do s). Como a visita de um cientista ao Maranhão e o pouso de um “estranho objeto” no Campo de Perizes, até hoje a única saída terrestre da ilha de São Luís. “Eu tinha medo de uma fuga em massa acontecer, então coloquei uma nave espacial ali”, relembrou.
Foi uma obra de arte, para o cronista — Apesar de o roteiro ter sido aprovado pelo Departamento de Censura da Polícia Federal, Sérgio Brito enfatizou que estava debruçado sobre ele horas depois da liberação da PF. “Aprovaram um negócio qualquer lá, sem ter muita noção do que se tratava”, contou. Dissociado dos efeitos sonoros, o programa também perdia muito de seu impacto. Na época, a Rádio Difusora já possuía uma emissora de TV, contudo, nos primórdios ela ficava no ar apenas algumas horas por dia (sempre entre a tarde e a noite, normalmente a partir das 14h). “É por isso que decidimos que a nossa Guerra dos Mundos precisava ir ao ar pela manhã de qualquer jeito!-, assinalou Serjão.
A nossa Guerra dos Mundos — A versão maranhense de Guerra dos Mundos foi ao ar sem nenhum tipo de ensaio: os participantes (entre eles o locutor Rayol Filho, que comandava o “São Luís Hit Parade”, programa musical bastante popular na época) foram recebendo os textos praticamente no momento em que deveriam ser lidos.
O que deveria ser — The War of the Worlds (A Guerra dos Mundos) é um romance de ficção científica de Herbert George Wells, um escritor britânico e membro da Sociedade Fabiana, foi publicado em capítulos primeiramente em 1897, no Reino Unido, pela Pearson’s Magazine[1] e lançado como um romance no ano seguinte. É uma história sobre a invasão da Terra por marcianos inteligentes, dotados de um poderoso raio carbonizador e máquinas assassinas, semelhantes a depósitos de água sobre tripés. Foi adaptado diversas vezes para o cinema, a última em 2005, por Steven Spielberg, com Tom Cruise no papel principal, Dakota Fanning e Justin Chatwin.[
Sumário do enredo original — A ação começa no início do século XX, nos arredores de Londres. O narrador e personagem principal, que não é identificado no livro, é convidado para ir ao observatório de Ottershaw, onde verifica a primeira de uma série de explosões na superfície de Marte. Mais tarde, aquilo que se pensa ter sido a queda de um meteoro perto da casa do narrador, acaba por ser a queda de um cilindro metálico. O cilindro abre-se, e de lá dentro saem os marcianos, que destroem todos os humanos que se aproximam com o raio da morte. O narrador foge então com a sua mulher para Leatherhead, mas tem que voltar à casa para devolver a carruagem que tinha pedido emprestado. Nessa altura, repara que os marcianos se locomovem em máquinas com tripés metálicos – os tripods – passando facilmente pela resistência militar oferecida pelos humanos. Têm, além disso, uma nova arma que dispara bombas de fumo negro, que matam todos os humanos que entram em contacto com ela. O narrador encontra então um artilheiro em fuga, que lhe diz que caiu outro cilindro, cortando o caminho de regresso à sua mulher. Os dois decidem viajar juntos, mas um ataque dos marcianos acaba por os separar.A narração passa então para a história da evacuação em massa de Londres, devido à queda de mais cilindros nos seus arredores, contada pelo irmão do narrador, que acaba por conseguir escapar por barco.
(Prosseguirá na próxima edição)