Uma divulgação maciça realizada todos os anos tem ajudado a difundir o folclore maranhense. O JP Turismo tem feito a sua parte através de seu suplemento semanal, produzindo textos e imagens que foram levados a feiras, congressos e eventos ao longo dos anos, antes desse surto pandêmico que paralisou os eventos locais, nacionais e mundiais. As secretarias, por intermédio de suas pastas de turismo e cultura, fomentam o setor em diversas regiões do país fortalecendo a vinda de turistas para o estado.
A dinâmica é executada por meio da propaganda dos produtos turísticos e culturais locais, na distribuição de souvenirs e peças publicitárias sobre os atrativos e a forte cultura maranhense levada a estados como o Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Pará, Piauí, Ceará, Amazonas, e em demais regiões e suas principais cidades, também com rodadas de negócios, workshops, palestras e um intercâmbio contínuo que ajudam a fortalecer cada vez o Maranhão como um destino que reúne todas as possibilidades de fazer bem aos visitantes, potencializado por uma natureza exuberante, gastronomia, cultura, folclore, artesanato, história, lendas, arquitetura, que formam um conjunto em potencial para o mundo.
As festas de Santo Antônio, São João, São Pedro e São Marçal movimentam a economia nesse período, principalmente, na capital São Luís. Essa efervescência local que acabou elevando os índices até o período junino de 2019, sempre foi notada através de uma crescente ocupação hoteleira existente na ocasião, que notadamente sofreu uma queda com as consequências da Pandemia da Covid 19.
Turistas de vários recantos do país e do mundo são vistos no período junino na capital maranhense, movidos por essa diversidade única aqui existente, diferenciando o Maranhão através dessas potencialidades dos demais estados da federação brasileira. Se ainda pecamos no que se refere ao receptivo turístico ou em relação à manutenção de nosso principal cartão de visita, o Centro Histórico, que ostenta problemas sérios com relação à iluminação, segurança e limpeza e das praias impróprias para o banho na capital, o cardápio cultural das inúmeras e ricas apresentações dos grupos folclóricos maranhenses, são uma riqueza imensurável aos olhos dos visitantes.
As festas dos santos
Quando as festas juninas chegam, o primeiro santo a ser referenciado é Santo Antônio. Celebrado no dia 13 de junho, o festejo, acontece no largo da igreja que leva o mesmo nome, situada na praça Antônio Lobo. A Paróquia realiza a festa com o famoso Arraial de Santo Antônio, que faz um enorme sucesso no período ao longo de décadas, preservando as tradições juninas e buscando manter em sua programação, na maioria das vezes apresentações de brincadeiras selecionadas que ainda se mantém intactas na sua originalidade.
Enfeitado com bandeirinhas e apresentando ainda dezenas de barracas típicas, de madeira e palha, no local são realizadas apresentações das agremiações folclóricas de raízes mais autenticas e tradicionais, além de brincadeiras como pescaria, laços de argolas, e outras diversões originárias da festa mais popular do calendário folclórico brasileiro, enquanto que outras vendem as comidas regionais, típicas maranhense do período como mingau de milho, canjica, milho cozido ou assado, pamonha, macaxeira, batata doce, garapa de cana, aluá, roleto de cana, os doces de coco, cocada e os pratos típicos arroz de Maria Isabel, Cuxá, Vatapá, além de tortas de camarão, caranguejo, sururu, e outras dezenas de opções.
No São João cresce a expectativa das fogueiras, dos rituais de batismo dos grupos de bumba meu boi, do espetáculo dos fogos de artifício, do colorido das bandeirinhas, dos ariris, e da grande diversidade de brincadeiras tradicionais que percorrem os largos, praças e arraiais, dentre as quais os grupos de bois, tambor de crioula, quadrilhas e danças como cacuriá, coco, portuguesa, lêlê, dentre outras manifestações culturais que se destacam no estado.
O ponto máximo, o êxtase, o auge das festas juninas no Maranhão acontece nos dias de São Pedro (29) e São Marçal (30). Nesses dois dias o movimento de turistas, atinge o mais elevado percentual de visitação, mais precisamente na capital, São Luís.
A festa de São Pedro – São Pedro é o santo protetor dos pescadores, a festa começa com os grupos de Bumba meu boi que se reúnem em um extenso largo na Capela de São Pedro, na Madre Deus na madrugada do dia 28 para o dia 29, onde essas brincadeiras amanhecem tocando para um público estimado em cerca de 50 mil pessoas que se mobilizam em torno das agremiações folclóricas em um dos mais autênticos, ritmados e coloridos espetáculos de cultura ao ar livre já visto. Na data também acontece a procissão marítima que é realizada de acordo com a crescente da maré, onde a imagem de São Pedro percorre toda a Beira-mar da capital em uma embarcação seguida de inúmeras outras.
Segundo informações de moradores, o festejo começou por volta de 1930, com as embarcações adentrando os rios Bacanga e Anil, passando pela orla que circunda a cidade, chegando até o antigo cais do Genipapeiro, voltando em seguida, retornando por baixo da Ponte de São Francisco, margeando a avenida Ferreira Gullar até a Ponta d’Areia e retornando até chegar ao ponto de partida da procissão, a Rampa Campos Melo, na Praia Grande. Daí prossegue a procissão, desta vez terrestre, até a Capela de São Pedro, onde as agremiações folclóricas continuam a pagar suas promessas subindo as escadarias da capela em um ritmo alucinante e contagiante.
A festa de São Marçal – São Marçal é realizado no bairro do João Paulo, é lá que outra festa reúne uma grande quantidade dos batalhões pesados de grupos de Bumba meu boi, os chamados bois da Ilha (também conhecidos boi de matraca), tendo à frente Maioba, Maracanã, Iguaíba, Madre Deus, Bairro de Fátima e São José de Ribamar que juntos com mais uma dezena de batalhões realizam esse outro grande evento no dia 30 de junho. A formação dos grupos acontece logo nas primeiras horas da madrugada, onde se percebe um conglomerado de vendedores ambulantes e de milhares de simpatizantes se concentrando desde o cedo para ver o desfile dos grupos que se formam por todo o dia, mesmo em horários em que a temperatura beira os 40 graus. No local é tradicional, a distribuição de caldo de feijão, por parte do 24º Batalhão de Caçadores, assim como água para os brincantes, amenizando a alta temperatura, tudo isso numa articulação de diversos grupos voluntários do bairro do João Paulo onde se dá o grande acontecimento. O evento é tão marcante que a Prefeitura de São Luís sancionou lei que alterou o nome da avenida João Pessoa para São Marçal, em junho de 2005, atendendo às reivindicações dos grupos folclóricos que fazem parte deste sotaque.
Os diferentes sotaques que compõe essa orquestra popular de rua maranhense
O Bumba meu boi é a manifestação folclórica de maior envergadura no contexto da cultura popular maranhense. Existe uma diversidade de formas pelas quais tais brincadeiras se apresentam. Nos bois do Sotaque de Matraca, os instrumentos de percussão que se destacam são as matracas, dois pedaços de madeira, de variados tamanhos, com média de 30 cm de comprimento, que são percutidos uns contra os outros, de forma frenética, com ritmo próprio, o que confere uma sonoridade contagiante.
Nesse sotaque, existem ainda os pandeirões, tambores-onça e maracás. Os pandeiros são instrumentos circulares, feitos geralmente de jenipapo, cobertos com couro de bode ou cabra (hoje misturados a pandeiros de nylon), os de couros são afinados a fogo, em fogueiras acesas ao largo das apresentações que os grupos realizam durante a noite. O tambor-onça é um instrumento cilíndrico, feito à base de flandres ou madeira, com uma das aberturas coberta por couro. No centro desta, pela parte aberta, é fixado um bastão no centro da cobertura de couro. Esse bastão é lubrificado com azeite ou água, que assim umedece um pano que é friccionado no bastão, produzindo um som semelhante ao urro de uma onça, daí a denominação do instrumento. Algumas vezes, caso não haja pano, a própria mão do instrumentista é utilizada diretamente no toque.
Os maracás, por sua vez, são fabricados com flandres. Possuem um aspecto circular e um cabo, por onde o brincante o segura e o percute. No interior dos mesmos são colocados fragmentos de chumbo ou outro material semelhante, e que, ao serem balançados, produzem um som característico. Os maracás são manejados pelos amos, vaqueiros ou rapazes. Em tal sotaque, merecem destaque os chamados Bois da Ilha, Maioba, Maracanã, Tibiri, Madre Deus, Mata, São José de Ribamar, Iguaíba, dentre outros.
Sotaque de Zabumba
Admite-se que seja o ritmo mais antigo de todos, sendo oriundo da região de Guimarães, Baixada Maranhense. Nesse sotaque, destacam-se os tambores, cobertos por couro, e que possuem cerca de meio metro de comprimento, confeccionados a partir de madeira ou compensado. Dessa forma, tornam-se pesados, de difícil transporte. Por causa disso, são tocados suspensos em forquilhas de madeira (descanso). Apresentam um ritmo pausado. Outros instrumentos são utilizados, tai como os pandeirinhos ou repinicadores, pandeiros menores do que os de matraca, além dos maracás.
Em São Luís, destacaram-se nesse sotaque os Bois de Leonardo (Liberdade), Antero, Newton, Canuto Santos e Laurentino (Fé em Deus) que, antes de falecer, passou a responsabilidade do grupo para dona Teresinha Jansen (falecida, em 2008), no ano de 1977, onde a mesma aumentou o grupo e lhe deu destaque como Boi da Fé em Deus. A brincadeira foi fundada, em 1930 por Laurentino, que nasceu no bairro Fé em Deus. Ele começou a brincar desde pequeno e já aos 15 anos bordou sua primeira peça. Os bordados do Boi são uma arte especial, onde poucas são as pessoas com o talento para confecção dos trabalhos de bordados.
Anualmente, vem sendo realizado no bairro do Monte Castelo, em São Luís, no início do mês de julho, o Encontro dos grupos de Bumba-Boi de Zabumba, com grande afluência de público, o que tem garantido, também, a popularização do sotaque. Uma festividade que devido a pandemia da Covid 19 não será realizada pelo segundo ano consecutivo.
Sotaque de Orquestra
Este sotaque oriundo da região do Munim é o mais recente de todos. Possui uma orquestra composta por instrumentos de sopro (metais, tais como saxofones, clarinetes, flautas) e cordas (banjo, dentre outros), bumbos, tambores-onça, maracás e até matracas. Nos últimos anos, os Bois de Orquestra tem se sobressaído dentre os demais, devido, principalmente, a uma modificação no brilho e luxo de suas fantasias, que com a evolução de uma cultura alternativa, passou a abrilhantar mais ainda os arraiais juninos.
Com destaque para a beleza das índias, que usam fantasias cada vez mais ricas e coloridas, os Bois de Orquestra tem seguido um caminho próprio, com muitas inovações rítmicas e melódicas, proporcionando mais dinâmica nas evoluções coreográficas das índias e no conjunto de seus grupos.
O ritmo também tem se modificado bastante, apresentando influências de outros ritmos musicais, modificando a feição original dos tradicionais grupos desse sotaque, mas sem perder a leveza do ritmo e a beleza nas suas apresentações. Entre as agremiações desse sotaque destacam-se, os Bois de Morros, Rosário, Axixá, Estrela de Bequimão, Nina Rodrigues, Boi dos Sonhos, Brilho da Ilha, Boi de Presidente Juscelino dentre outros.
Sotaque de Pindaré
Os grupos assim representados recebem esta denominação em virtude do fato de que o município de Pindaré deu origem ao sotaque. Também chamados de Bois da Baixada. O estilo é muito parecido com o de matraca, só que o ritmo é mais lento, com os pandeiros sendo menores que os tradicionais e tocados mais frequente para baixo e nas laterais do corpo, diferente do sotaque da ilha que é batido no alto do corpo. As fantasias também são diferenciadas, com as cazumbas apresentando máscaras bem trabalhadas, algumas delas verdadeiras esculturas, às quais são acrescentadas pequenas luzes piscantes, uma sofisticação recente. Os chapéus dos rajados também se destacam, sendo bem grandes e pesados, com beleza singular pelos detalhes de suas formas e pelo brilho de seus canutilhos, miçangas e demais ornamentos. Neste sotaque são bem conhecidos os Bois de Pindaré, São João Batista e Viana.
Sotaque de Costa de Mão
Neste sotaque, dentre os quais se destaca o Boi de Cururupu, os grupos se utilizam apenas de dois instrumentos: pandeirinhos (que são tocados com a costa da mão, daí a denominação do sotaque), apitos e maracás. O ritmo é lento, marcado, melodioso e contagiante. Com grupos bem característicos, destaque em Cururupu ao amo Manoel Rabo, que tocava seu pandeirinho com uma vela na mão.
A festa
O São João do Maranhão é um folguedo de grande significação estética e social em relação ao folclore brasileiro, com maior predominância na região nordeste, sendo considerada uma das mais ricas brincadeiras do folclore do país e o maior espetáculo popular do Maranhão, tendo sua origem ligada ao catolicismo no século XVIII, mesmo que sua manifestação seja considerada de caráter lúdico.
Embora esteja presente em todas as regiões brasileiras, em certas localidades essa manifestação cultural é mais marcante, apresentando características peculiares, como pode ser exemplificado através do Bumba meu boi do Maranhão, possuidor de elementos únicos no que se refere à forma dessa brincadeira, como também são denominadas tais manifestações de cunho cultural imaterial. Brincadeira é uma palavra que designa não somente o Bumba meu boi, servindo também para identificar grupos que realizam apresentações de outras manifestações culturais no Maranhão.
O Bumba meu boi vem sendo estudado há muito tempo, e já foi considerado uma dança, uma representação teatral, ou uma brincadeira, não por designação de termos culturais, mas pela manifestação dos próprios atores e dançarinos que compõem o elenco do espetáculo, onde dançam, representam e se divertem, considerando o espetáculo, tempos atrás, como forma de diversão dramática, que se coloca entre a dança, o jogo, a festa e o teatro, espécie de ópera popular, uma dramatização que foi classificada até como tragicomédia, levando em conta a formação de seus personagens alegóricos, encenações contextuais, a reprodução dos conflitos e os desenlaces de forma alegre e carnavalesca presentes no Auto.
O ritual do Boi
Ao longo do ano, a brincadeira atravessa vários períodos determinados, que integra o chamado Ciclo do Ritual, composto pelo Renascimento (ensaios, quando os brincantes se reúnem novamente para dar início à reorganização da brincadeira, e os amos entoam novas toadas, que são memorizadas por todos), o Batismo (que acontecia na véspera de São João), as Apresentações (que possuem uma sequência básica, com as toadas designando as passagens: Guarnicê, Lá Vai, Toadas de cordão, Pique, o Auto, Urrou e Despedida), com a representação do Auto e a Morte do Boi.
No auto, era encenada a estória de vários personagens, os principais sendo Mãe Catirina, a esposa de Chico vaqueiro grávida que deseja comer a língua do boi mais valioso da fazenda, um negro vaqueiro, Chico, marido de Catirina, que mata o Boi e dá a língua do mesmo para sua esposa, um homem branco, dono da fazenda, e o Boi. Outros personagens também fazem parte da trama, tais como os caboclos, vaqueiros, as índias, os índios, o rapaz, o pajé, o padre, o médico, o palhaço, o miolo, a burrinha e os cazumbas.
O batismo é feito bem as vésperas do dia de São João, após a festa acontece a Morte, uma tradição dos grupos que levantam mastros e fazem distribuição de comidas aos seus brincantes. Mesmo assim, alguns grupos ainda sobrevivem no interior do estado, apresentando-se como no passado, o que pode ser uma boa opção turística para quem deseja se aprofundar no conhecimento da brincadeira, e mesmo alguns grupos da capital ainda realizam o ritual de forma tradicional, a despeito das mudanças.
A festa na grande São Luís é encerrada com o tradicional Lava Boi, no município vizinho de São José de Ribamar, quando uma significativa quantidade de grupos é reunida em grande apresentação, uma semana após o término do período junino, celebrando o Bumba Meu Boi, o maior espetáculo da cultura popular do Maranhão.
Texto: Paulo Melo Sousa e Gutemberg Bogéa
Edição: Gutemberg Bogéa