A festa do Hetohoky, que acontece na Ilha do Bananal, no Estado do Tocantins, é uma celebração tradicional dos indígenas do povo Karajá.
Essa festa milenar é passada de geração em geração e tem como enredo a história de um indígena que emerge das profundezas do rio Araguaia para conhecer o mundo exterior.
Além disso, a festividade também reúne elementos de várias aldeias marcando a transição dos meninos para a fase adulta.
O evento é realizado durante todo o mês de março, em várias aldeias Karajá. Na aldeia Santa Isabel do Morro, o Hetohoky começou no último fim de semana e reuniu cerca de 3 mil indígenas.
O ponto alto da festa acontece com disputas esportivas, como cabo de guerra, luta corporal e a competição de derrubada de um gigantesco tronco fincado no centro da aldeia. Essas atividades testam a força dos participantes e simbolizam a defesa de seu território, contra a aldeia visitante invasora.
Para encerrar com chave de ouro, a última semana de março reserva a aldeia Fontoura como palco do ‘grand finale’, proporcionando um desfecho memorável para esse período festivo.
Ritual
Em cada aldeia, durante o período de sete dias, os garotos chamados de aruanãs ficam na “casa grande”, sob os cuidados de adultos, onde recebem orientações de sobrevivência e aprendem sobre defesa de território e autodefesa. Essa parte do ritual é fundamental para o desenvolvimento dos jovens na comunidade.
É uma festa rica em detalhes e significados, desde as pinturas corporais, indumentárias e até as disputas esportivas. Cada momento da festa possui um significado especial. Os jovens participantes se preparam intensamente para a festa, com jejuns e práticas de lutas corporais.
Durante o Hetohoky, uma das danças tradicionais realizadas é o Jire, que representa o espírito da ariranha. Essa dança é executada com movimentos graciosos e ágeis das crianças imitando os movimentos do animal na água. Os dançarinos usam trajes coloridos e máscaras que representam a ariranha, criando uma atmosfera mística e envolvente.
O Jire é considerado uma forma de homenagear e celebrar a presença desse animal tão importante na cultura e na natureza da região. Durante a festa do Hetohoky, essa dança se torna um momento especial de conexão com a espiritualidade e com a fauna local.
Para o visitante tory (não índio), a festa é também uma oportunidade de vivenciar a cultura indígena e valorizar as tradições dos povos tradicionais da floresta. É um momento único de conexão com a natureza e de aprendizado sobre a rica história e identidade cultural dos povos originários, assim como a conexão profunda que eles têm com a natureza e suas origens, além do fortalecimento da identidade cultural dessas comunidades.
Biodiversidade e etnoturismo
O Governo do Tocantins está desenvolvendo projetos de etnoturismo na Ilha do Bananal, com o objetivo de promover as festas tradicionais e a rica biodiversidade da região.
Esses projetos visam manter as tradições dos povos indígenas e envolvem parcerias com as pastas do Turismo, da Cultura e dos Povos Originários.
O turismo na Ilha do Bananal permite experiências e vivências com a natureza e com os povos originários. A valorização da festa também é sinalizada com a estruturação do Acampamento Hatanã, um local para receber turistas e proporcionar um contato mais próximo com a cultura indígena.
O secretário de Turismo do Tocantins (Setur), Hercy Filho, destaca a importância de valorizar a riqueza cultural do povo Karajá e a beleza natural preservada da Ilha do Bananal. “Além de promover experiências autênticas e enriquecedoras para os visitantes, contribui para a geração de renda e o fortalecimento das comunidades locais”, destacou.
Governo do Tocantins reforça ações de estímulo ao etnoturismo
Em 2022, o Rally Sertões BRB fez uma travessia inédita pela Ilha do Bananal, após passar pelo Mato Grosso, depois de longa negociação com o governo tocantinense e todas as instituições relacionadas à salvaguarda indígena. A competição não passou dentro das aldeias, para não impactar a rotina e cultural locais. Mesmo assim, deixou seu legado.
O principal desafio era mostrar a beleza da região e a riqueza cultural dos povos moradores locais, sem impactar a Ilha, um santuário preservado de flora diversificada e marcada pela transição entre a Floresta Amazônica e o Cerrado. Na ilha também encontram-se muitas características da flora do Pantanal Mato-grossense, como maçarandubas, orquídeas, canjeranas e piaçavas.
Com cerca de 20 mil quilômetros quadrados de área, a ilha do Bananal é a maior ilha genuinamente fluvial do mundo. Cercada pelos rios Araguaia e Javaés, é considerada Reserva da Biosfera pela Unesco desde 1993, estatuto concedido a áreas protegidas que cobrem porções de ecossistemas terrestres ou costeiros e que cumprem alguns requisitos, como buscar meios de conciliar a conservação e o uso sustentável dos elementos da biosfera, particularmente a diversidade biológica.
Passados dois anos, o rally ainda está na lembrança de muita gente. A empresária Katharina Brazil saiu de São Paulo para prestigiar o ritual do Hetohoky. Convidada pelo Cacique da Santa Izabel, ela explicou que sua primeira visita ocorreu como integrante da competição. Desta vez, teve tempo suficiente para participar das vivências de preparação para a cerimônia.
“Os indígenas vivem o momento, nós que vivemos na cidade não sabemos mais fazer isso. Sempre fazemos as coisas pensando no amanhã, mas o indígena vive o momento, e isso pra mim é muito interessante”, comentou a visitante ao enaltecer a cultura e o modo de vida dos indígenas.
Texto: Antônio Neves