Sem nenhuma alusão nominal ao Grita (Grupo Independente de Teatro Amador), que justamente encena a Via-Sacra do Anjo da Guarda, desde 1981, foi, realmente, gritante o atraso ocorrido na performance dos dois dias (na quinta-feira e sexta-feira Santa, 6 e 7 de abril, entre 19h30min e 23h30min), neste ano. Novamente, marquei presença, como jornalista, escritor e admirador do trabalho de bem-comum, que, há 42 anos, vem consolidando a autoestima do bairro, traduzindo o sentimento libertário da Paixão de Cristo para a população, forjado pelo idealismo de então jovens artistas, quanto Gigi Moreira, Cláudio Silva e Zezé Lisboa, contando, na trajetória, com outros alterosos, que nem o professor e ator Nathan Máximo. Gigi Moreira já é de saudosa memória; seus companheiros de viagem permanecem mourejando, e sabem de cor e salteado do que e por que eu falo assim, e trato com autoridades do primeiro escalão, se, por desatenção, alguma do estrato subalterno manifestar-se em estéril presunção.


Inseridos no contexto, para dar mais força exitosa, centenas de moradores do Anjo da Guarda e adjacência colaboram com a execução da peça, entre atores, produção e equipe técnica. A montagem, em sete atos, percorre cerca de dois quilômetros de vias do bairro. O prejudicial retardamento foi percebido, incontinenti, pelo ator César Boas, incensado, bem na minha frente, sob uma grande tenda, pelo reconhecimento do pessoal da técnica/sonoplastia e moradores do bairro, decantado de TV a outdoor, e que não tem o costume de apresentar papa na língua, desde o tempo das vacas magras do hoje rechonchudo show Pão com Ovo: “Tudo bem! Só não pode ir até à meia-noite!”— deu o tom da falha que viu para mim, já no transcurso da Procissão do Senhor Morto, nas ruas centrais de São Luís, na tarde/noite de sexta-feira Santa. Foi acompanhado, no senão, pelo fotógrafo de mão-cheia Djalma Raposo, que afirmou haver acontecido, no segundo dia, entre 19h30min e 23h30min, e “Seria melhor para todo mundo, mais cedo”, ele, ali, impedido de bater fotos do ator Jorge Smith, após a crucificação de Jesus Cristo, que este representou. Será melhor levarem o ator e o fotógrafo em consideração por personalizarem, há um bom tempo, imã e caixa de ressonância de comunitários, no teatro e na fotografia.


Paixão de Cristo no Estrangeiro — Tenho dito e escrito que o projeto exitoso da Via-Sacra foi amadurecido com os primeiros tempos, na poeira das ruas e avenidas do Estrangeiro (relativo a que países de todos os continentes dão nomes às artérias, com o núcleo habitacional apelidado assim pelos que o originaram, entre os quais, tive a honra de estar, gracejo com superação, jamais diminuição). No futuro, teria um norte: 1.º Ato: na Praça Recanto da Paixão, com o Sermão da Montanha; 2.º Ato: Caminhada de Ramos/Entrada de Jerusalém, na Av. Dinamarca; 3.º Ato: odaliscas, prostituta, os vendilhões no Templo, com a memorável repreensão de Jesus a Barrabás, e sacerdotes querendo pegar o Messias numa contradição, no episódio em que a mulher adúltera seria apedrejada até morrer pela turbamulta: “Atirai a primeira pedra, quem nunca pecou!”, no Largo do Teatro Itapicuraíba; 4.º Ato: Santa Ceia, Conspiração, Jesus perante Caifás, etc.; 5.º Ato: Mulheres de Jerusalém, Verônica e Simão Cireneu, na Av. Odylo Costa, filho; 6.º Ato: Corredor da Reflexão, na Rua Palestina; e 7.º Ato: Encontro de Jesus com Maria, Crucificação, Enforcamento de Judas, Anjo da Anunciação, e Ressurreição, na Praça da Ressurreição. Louvação para os construtores dos espaços!


Bendita elevação para a plateia. Falas cortadas?! — No engenhoso palco rotatório, na Praça do Anjo, o imperdível cenário da Ceia de Jesus com os apóstolos, a conspiração para a Sua Morte e a compra da delação de Judas por 30 moedas de prata, Cristo perante Caifás, Pilatos (lavando as mãos do sangue do Inocente) com os sacerdotes. Bendita a ladeira (a mais íngreme do residencial mais populoso da área Itaqui/Bacanga), na Av. Odylo Costa, filho, que aplainamos com as nossas passadas, desde a fundação do bairro, que nos concede uma visão total do incomparavelmente belo 4.º Ato da Via-Sacra do Anjo da Guarda. Foi ali que um casal (que preferiu ficar no anonimato a identificar-se, para a minha Reportagem) enfatizou que poderiam haver suprimido, ou modificado, umas falas. Não acompanhei bem esse lance (encontrava-me com os olhos rasos d´agua, lacrimejando como em 1981, quando olhei amigos, egressos da Madre de Deus e da Salina do Lira, desde 1970, sem qualquer traquejo cênico, soprando como podiam a chama artística que se estendia: Areu, o radialista Ribamar Furtado (Jesus), Maria Garcez (Mãe de Jesus), e de soldados romanos, Marechal (José Garcez), e Pedro Cego ( Pedro Batista dos Santos), e está aqui o espaço para a direção do espetáculo clarear se os cortes existiram ou não. Se foram forçados pela estreiteza do tempo, então, a hora é para que não haja repetição da falta. No primeiro ano, deu-se, entre o pôr-do-Sol e o meter da cara de uma lua cheia, na boca-da-noite, com o elenco e diretores recebendo experiência para atuar melhor, nos outros anos; voltar ao tempo da origem, iniciando de tardezinha, não será demérito!


Não deixar a ajuda oficial para a última hora! — Saltou aos olhos mesmo foi que a trupe do Grita foi obsequiada com recursos financeiros dos órgãos oficiais da Cultura, para a montagem da Paixão de Cristo, quase na estreia: A noite já corria célere, e a oficina, na Praça Recanto da Paixão, “Se virava nos 30”! Jesus deu início ali à Sua Paixão, beirando às 20 h, debaixo de uma chuvinha. Para este repórter, olhos de lince, o ideal será a Via-Sacra, sem arremates de última hora, estar tinindo, na antevéspera da exibição! Aí, duvido se haverá necessidade de um improviso, por mais bonito que seja! Estou oferecendo, desde 1981, quando na Redação de O Imparcial, o que mais eu posso para colaborar; editor-geral, no jornal Diário do Norte, em 1987, vociferei para as autoridades competentes, pois cada qual queria ser mais importante que o convite, e a grana, que era melhor, para resolver a parada, necas! Quase na Semana Santa, era pescaria “de rosca”, qual no bem-dito dos pescadores, sem peixes! Saiu de parto cesariano, depois que rasguei o verbo numa edição virulenta!
Massificar na mídia televisiva — Será imprescindível uma tonitruante e extensa publicidade da Via-Sacra, no rádio e TV, e o outdoor necessita ser maior do que o microscópico exibido no Jaracati. Não será nenhum milagre essa multiplicação dos peixes pela benquerença à nossa bonita e comovente Via-Sacra!
Ganhos ao Turismo e ao nosso amor-próprio — Sem retardo, todo mundo sairia ganhando, a começar do receptivo indígena, com os nossos visitantes sabendo do começo ao término da teatralização. Há 10 anos, observei ônibus enfileirados na Av. dos Portugueses, dentre os quais, um de Timon (MA) e Pindaré-Mirim (MA), sem a reincidência depois. Com mais badalação, ecoaria no Brasil e aumentaria a responsabilidade de cada vez fazermos mais forte a Via-Sacra do Maranhão.


Páreo à Paixão de Cristo de Nova Jerusalém — A nossa Via-Sacra não pode ter um guarda-roupa mais vistoso qual o da Paixão de Cristo de Nova Jerusalém, no município de Brejo da Madre de Deus, a 202 km do Recife (PE), com atores da TV Globo? Quem disse que não? Bastaria que os Palácios dos Leões e o de La Ravardière fumassem o cachimbo da paz que surgiriam os nossos soldados romanos, com capacetes, escudos e lanças mais reluzentes, e centuriões, com os peitos mais pulsantes sob armaduras prateadas, e bem que um deles, à general de César, poderia comandar uma legião, num garboso cavalo, fosse um alazão ou negro com que a briosa PM (com patrulha montada, além de a pé e motorizada) mostrou como se faz segurança na área do Anjo da Guarda, sem recorrer a dar uma cacetada no cravo, outra, na ferradura, com um “toc-toc-toc” de fazer recuar malfazejos. A nossa Via-Sacra predomina com uma expectativa de 300 mil espectadores, nos dois dias; a de Nova Jerusalém, com ingresso pago, estaciona em10 mil, em uma semana.


O parto monumental do Grita — Eu assisti de cadeira ao fenomenal parto artístico: O Grita foi criado em 1975 e, em 1977, incorporou-se ao Conselho Comunitário Católico (agitado pelo nosso amigo, naquela data, padre canadense João Maria, consoante repassou ao repórter o músico Rubinho Silva), com a metodologia do Teatro Comunitário. Passo adiante essa verdade de grandeza especial: “Várias produções de espetáculos, projetos sociais, promoções artístico-culturais são desenvolvidos em sua sede (o Teatro Itapicuraíba), contudo, sua maior vitória é a Via-Sacra”. Em outras palavras: Atiça o protagonismo comunitário, na perspectiva da formação da consciência crítica e política da sociedade, concebendo a reflexão através da arte, insuflando a construção de uma nova ética, na melhoria da convivência social. Aí está inserida uma geração, abraçada pelo Teatro Itapicuraíba, com centenas de bons sucessos, pelos estudos, por uma profissão escolhida e pelo labor teatral.
Vi de perto, para contar de certo, e, portanto, assino embaixo! Avante, Via-Sacra do Anjo da Guarda, e, na medida do possível, seja a maior a céu aberto do País!
Texto: Herbert de Jesus Santos