O time de Buritirana goleou um combinado de vários outros municípios maranhenses por 4×0. A partida durou meia hora. Caíque, de 11 anos, cursando o quinto ano, Luciano Jr., 10, também cursando o quinto ano, e Alan, 8, do terceiro ano, eram só alegria, pela vitória, terminando de gastar as energias que sobraram do amistoso pelos brinquedos e equipamentos de ginástica da Praça do Letrado, no Vinhais, em São Luís. “Sim” foi a resposta em uníssono quando indaguei-lhes se queriam ser atletas profissionais. O mais velho e o mais novo são flamenguistas; o do meio, são-paulino.
O conselho que lhes dei, “não basta ser bom de bola, não pode parar de estudar”, eles devem ouvir repetidamente. O trio integra o conjunto de crianças e adolescentes filhos e filhas de catadores e catadoras de materiais recicláveis ou de famílias de baixa renda atendidos pelo projeto Catadores de Direitos, realizado pela Cáritas Brasileira Regional Maranhão com apoio da Kindermission desde 2012 – e de forma ininterrupta desde 2017.
É uma manhã ensolarada de sábado e estamos no “Festival Estadual Nossos Talentos, Nossos Direitos”, que ocupou a praça pública em São Luís, após ter etapas regionais realizadas nos municípios de atuação do projeto: Bacabal, Balsas, Imperatriz, Lago da Pedra e Loreto. Futebol, roda de capoeira, música, poesia, dança e teatro integraram o cardápio do festival, uma mostra de talentos a demonstrar o que a gurizada aprendeu durante o projeto, que passará por avaliação em novembro, ocasião em que definirá novos municípios de atuação. Também para novembro está previsto o lançamento de um vídeo-documentário sobre o projeto, em fase de finalização.
“Em alguns municípios as equipes estão bem organizadas e continuarão o trabalho. A Cáritas está aberta a parcerias”, destacou Lucineth Cordeiro, da coordenação colegiada do organismo da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) no Maranhão, reforçando o princípio de rotatividade do projeto e das ações da Cáritas.
Luziane Alves é mãe de quatro filhos atendidos pelo projeto Catadores de Direitos. “Percebi que eles melhoraram em casa e no desempenho escolar, são interessados em leitura”, afirma sobre os filhos, que têm entre oito e 13 anos.
Instrutor de capoeira, Onivaldo de Assis, 44, atua há dois no projeto, em Bacabal. “É um longo trabalho de conscientização. É preciso despertar a vontade de querer aprender, valorizando o esporte e a cultura, fazendo essa moçada crescer como pessoas, ser alguém na vida. É um trabalho árduo, que une conhecer direitos com ter saúde”, comenta.
Gleicilene Araújo, 13, conta ter aprendido capoeira, carimbó, futebol e violão – ela foi uma das que se apresentou ao instrumento, cantando uma música sobre o meio ambiente. “É um projeto importante. Conheci pessoas que passaram a ir e conseguiram sair do mundo das drogas”, revela.
O sol a pino não esmorecia os presentes, animados pelo mestre de cerimônias Tedd Mac, que sabe unir bom humor e dicas úteis para a garotada – em perfeita sintonia com os valores ensinados aos beneficiários do projeto. Motivos para sorrir não lhes faltavam: estavam ali a exibir seus talentos e ganhar medalhas, que penduravam no pescoço, orgulhosos, conscientes de seu papel de sujeitos de direitos, mesmo que uns insistam em negar ou dizer o contrário.
“Os meninos e meninas e o povo no poder eu quero ver”, era palavra de ordem, grito de guerra – ou de contra-ataque, com endereço certo. “Criança tendo voz, vez e lugar: esse é o país que a gente quer”, afirmou Lena Machado, secretária executiva da Cáritas no Maranhão. “Eles não precisam de sorte, é de oportunidades que precisam, de respeito a seus direitos, para que cresçam em graça e sabedoria”, finalizou, certa da missão ao mesmo tempo cumprida e em progresso.
Texto: Zema Ribeiro