A Academia Ludovicense de Letras é uma nau que tem singrado, com a audácia dos desbravadores, as ricas águas da cultura e da literatura são-luisense. É uma construção coletiva, afirmando-se como um baluarte na defesa das tradições literárias maranhenses e, em particular, ludovicenses, na promoção dos nomes consagrados, promissores ou imerecidamente olvidados da literatura destas plagas e na valorização dos feitos e do legado da Atenas Brasileira.
Ó Guerreiros, meu relato ouvi! Muitos foram, da sacada do tempo, aqueles que sonharam com uma academia de letras em São Luís. Mas a entidade, nascida a 10 de agosto de 2013, no berço palaciano do Cristo Rei, em frente ao Largo dos Amores, na cidade fundada pelos franceses Daniel de La Touche e François de Razilly em 1612, é tributária, sobretudo, do sonho do professor Wilson Pires Ferro, meu pai, da Universidade Federal do Maranhão, revelado em dois artigos de sua lavra, publicados no jornal O Estado do Maranhão. Um dos artigos, de 2012, outro de 2013, pugnando pela criação de certa Academia Ludovicense de Letras, sob a sigla ALL, dentre outras sugestões de denominação. O último artigo encontrou poderoso eco na professora Dilercy Aragão Adler, autora e coordenadora do projeto “Mil poemas para Gonçalves Dias”, do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão, a qual aceitou o desafio de converter a ideia em realidade, inserindo a proposta na programação em homenagem aos 190 anos de nascimento do grande poeta Gonçalves Dias, e coordenando os esforços e providências para a concretização desse sonho, com o auxílio de valorosas mentes e mãos.
O cenário foi o auditório dos Colegiados Superiores do Palácio Cristo Rei, diante da praça em homenagem ao celebrado autor da “Canção do Exílio”. Os manitôs não fugiram da taba. Anhangá não pôde entrar, nem proibir sonhar. Sob o olhar de Tupã, ali se reuniram 25 intelectuais para o ato de fundação da Academia Ludovicense de Letras, uns por convite, outros como integrantes da Comissão Organizadora. Sou um desses fundadores. Não foi um fato isolado, mas um dos pontos altos da programação do evento “Mil poemas para Gonçalves Dias”, promovido pelo Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão, pela Federação das Academias de Letras do Maranhão e pela Sociedade de Cultura Latina.
O projeto representou o derradeiro tributo do IHGM ao quadricentenário de fundação da capital maranhense.
A entidade possui Estatuto e Regimento Interno. O primeiro, aprovado em 14 de dezembro de 2013, quando foram eleitos a primeira Diretoria e o primeiro Conselho Fiscal. Roque Pires Macatrão foi o primeiro presidente, tendo sido sucedido por Dilercy Aragão Adler, Antonio Noberto e Daniel Blume, atual capitão da nau ludovicense. As sessões ordinárias são mensais, regra essa que a pandemia, desafortunadamente, tem tornado de difícil observância. Vestimos capelo, de minha concepção, nas cerimônias oficiais. Nossas notícias fluem pela ALL em Revista, sob a incansável batuta de Leopoldo Gil Dulcio Vaz.
Há quatro categorias de membros na ALL: efetivos, honorários, correspondentes e beneméritos. Na dos efetivos, há 40 cadeiras, seguindo a tradição da Academia Francesa. Essas cadeiras são numeradas por ordem cronológica crescente de nascimento dos patronos, vultos da literatura maranhense, tais como o próprio Gonçalves Dias, os irmãos Artur e Aluísio Azevedo, Coelho Neto, Graça Aranha, Mário Meireles, Josué Montello, Lucy Teixeira, Conceição Aboud, dentre outros, selecionados por votação dos fundadores, na proporção de um nascido em São Luís para cada não nascido, mormente a partir de lista preparada pelo professor Wilson Ferro, abrangendo dados sobre a vida e a obra de mais de 70 luminares das letras timbiras. De início, as cadeiras foram ocupadas por fundadores; outras o seriam por não fundadores, mas por indicação de um dos 25, como é o caso de Ceres Costa Fernandes, numa fase de transição da ALL, ou por eleição, que é o sistema atual, pelo qual o confrade Antônio Ailton ingressou no sodalício.
Há de ser ressaltado o perfil de pioneirismo e vanguarda da Academia Ludovicense de Letras em vários aspectos, com destaque para a sua condição de primeira academia de letras oficialmente reconhecida da cidade de São Luís, com personalidade jurídica, assim como para a inegável valorização, em perspectiva histórico-comparativa com outras associações congêneres no Maranhão e mesmo no país, da contribuição da mulher para a cultura e a literatura da Atenas Brasileira. Essa valorização se anuncia na adoção do cognome de Casa de Maria Firmina dos Reis e se confirma à medida que exploramos as listas de patronos, fundadores e membros efetivos da Academia, apresentando seis nomes femininos no primeiro caso, três, no segundo, e sete, no terceiro. E culmina com a constatação de que a patrona da entidade, a escritora Maria Firmina dos Reis, ela própria uma pioneira escritora nacional, é a oitava estrela de uma constelação de grandes nomes da literatura maranhense retratada em seu brasão e na sua bandeira, ambos de minha autoria, sob o lema Savoir pour transformer.
Ó Guerreiros, meu relato ouvi! Seja promovendo eventos de literatura ludovicense ou maranhense ou publicando obras, seja participando ativamente de feiras literárias ou homenageando personalidades da terra, a ALL ocupa hoje um proeminente lugar no cenário cultural timbira, assentando-se em leito de folhas verdes. Gonçalves Dias, o Gigante do Largo dos Amores, inspiração para a fundação da Academia, contempla feliz o horizonte, do alto de sua palmeira, na certeza de que essa nau muito tem a navegar…
Texto: Ana Luiza Almeida Ferro
Ana Luíza de Almeida Ferro é membro fundador da Academia Ludovicense de Letras (Cadeira nº 31). Promotora de Justiça, escritora, historiógrafa, poeta, conferencista internacional, professora e Coordenadora do Programa de Pós-Graduação da Escola Superior do Ministério Público do Maranhão (ESMP-MA), Doutora e Mestra em Ciências Penais (UFMG), Pós-Doutora em Direitos Humanos (Universidad de Salamanca, Espanha), Membro de Honra da Sociedade Brasileira de Psicologia Jurídica, membro da European Society of International Law (ESIL), do PEN Clube do Brasil, da Academia Brasileira de Direito, da Academia Maranhense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão e de diversas outras instituições culturais. Portadora do Diplôme supérieur d’études françaises (Université de Nancy II). Autora de vários livros, sobretudo de Direito Penal, História e poesias. Recebeu o Prêmio “Poesia, Prosa ed Arti figurative” (Itália, 2014, 2019), a Menção Honrosa do Prêmio Pedro Calmon 2014 (IHGB), o Prêmio Literário Nacional PEN Clube do Brasil 2015 (Ensaio) e o Prêmio Vianna Moog no Concurso Internacional de Literatura da UBE-RJ, edição 2017. E-mail: alaferro@uol.com.br.