Coisa boa é ter amigos generosos, e tenho a sorte de ter alguns. Os mais próximos, que sabem do que gosto, e o que coleciono, -para minha mulher, acumulo; sempre me trazem pequenos mimos quando viajam.
Mas tem aquele amigo, que ao partir em viagem e me pergunta se desejo que me traga alguma coisa, ultimamente, respondo sempre o mesmo: “Traz-me uma história.” É através das histórias que melhor vemos o mundo e nos deixamos surpreender por ele. Uma história é um presente magnífico, porque é um fragmento de vida, não apenas de paisagem.
Gosto de ouvir histórias/estórias, que me enriquecem.
Tony, amigo que fiz em viagens pelo mundo, encontrei-o no Rio, recentemente, onde mora. Dividimos uma mesa de bar, ao cair da tarde, no burburinho de Copacabana.
Tony ficou viúvo no ano passado. Jaqueline, sua companheira há 34 anos, morreu de câncer. Não conheci Jaqueline, vi fotografias dela, e nos falamos uma vez por telefone. Estava em uma ligação com Tony, ele no Rio, eu em casa, em São Luís. Ele ligara para comentar uma crônica minha, e passou o celular para Jaqueline falar comigo. Voz rouca, de fumante, carioca típica, falamos amenidades, por alguns minutos. Ela falou que Tony sempre lhe mostrava as crônica, e gostava como tratava as mulheres nos meus texto. Agradeci.
Agora estava Tony a me contar sobre a saudade da companheira, da solidão, e de uma paquera, uma vizinha de prédio. Falou de sua visão de mundo, tudo muito complicado, as pessoas muito corridas e ausentes. Falou da filha, que casou com o francês e se mudou para Europa. Tinha um neto de meses, que ainda não conhecia.
Me falou que depois da guerra no norte da Europa, que desorganizou a economia de todo o mundo, viajar para fora do Brasil ficou complicado.
Com a vizinha saiu algumas vezes, mas que o vazio da falta de Jaqueline continuava.
Cinéfilo, Tony falou que assistiu o filme “O último ônibus”, do diretor Gillies MacKinnon. O filme conta a história de um senhor viúvo, que usa seu passe de ônibus gratuito para viajar para o outro lado do Reino Unido, onde ele e sua esposa moravam, carregando as cinzas dela em uma pequena mala.
Tom Harper (Timothy Spall), um viúvo de 90 anos, sai sozinho em uma viagem épica rumo à sua casa de 50 anos atrás, partindo de uma vila remota no Nordeste da Escócia até o extremo sul da Inglaterra. Ele atravessa a Grã-Bretanha em uma jornada de 1.400 quilômetros. Lutando contra o tempo e as limitações da idade, ele precisa cumprir uma grande promessa feita à sua amada esposa Mary. Nosso intrépido herói enfrenta uma incrível odisseia, revisitando seu passado, conectando-se com um mundo moderno que ele nunca experimentou, e com uma Grã-Bretanha diversif icada e multicultural.
Pergunto para Tony se gostaria de fazer uma viagem dessa, igual à do velho Tom Harper.
-Não, sou comodista, hoje prefiro carregar as lembranças de Jaqueline comigo.
Tomamos mais uns chopes, nos despedimos. Tony me ligou hoje, arranjou uma jovem namorada; quer viajar, mostrar o mundo pra ela.
Luiz Thadeu Nunes e Silva, Eng. Agrônomo, Palestrante, cronista e viajante: o latino americano mais viajado do mundo com mobilidade reduzida, visitou 151 países em todos os continentes da terra. Autor do livro “Das muletas fiz asas”.
Membro do IHGM, Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão.
E-mail: luiz.thadeu@uol.com.br