Dezembro, derradeiro mês do ano se despede. Desacelero de meus compromissos, quero paz para gozar o ócio. Um ócio nada criativo, apenas a preguiça de não fazer nada, apenas contemplar a passagem do tempo.
Acordo, tomo café, chove lá fora. A primeira chuva forte de dezembro. Amo chuva. Sinto o cheiro de terra molhada que me transporta para infância. Minha infância lembra chuva, fruta no pé, passarinhos e terra molhada.
Em tempos tórridos, chuva é um bálsamo. Segundo os serviços meteorológicos, o ano que finda foi o mais quente nos últimos 125 anos. Oxalá não morrermos torrados, em breve.
Ao meu lado, refastelados, Duck e Fiona, meus fieis amigos, amor sem tamanho, dormem sem se preocuparem com o amanhã.
Pedi para Alexa tocar MPB. Um desfile do melhor do cancioneiro nacional inunda o ambiente: Gal Costa, Maria Betânia, Luís Melodia, Djavan, Chico Buarque, Frenética, Tim Maia, Elis Regina, Emilio Santiago, Alcione, Marisa Monte, seu Jorge, Cássia Eller, Lenine, Rita Lee e Zeca Baleiro. Até Roberto Carlos em dueto com a saborosa Jennifer Lopes, cantando “Chegastes”, alegram minha manhã. Se tem uma coisa que sabemos fazer bem é música.
Nestes dias de despedida de 2023, aproveito para acalmar mente e coração. Fujo do frenesi do comércio, das falsas confraternizações, dos apelos da mídia; prefiro o sossego de casa. Ainda mais quando fico a sós com meus cachorros, minhas músicas e meus livros. Prefiro a companhia de Duck e Fiona à ter que conviver com pessoas que se acham importantes, quando são apenas chatas.
Não sou homem de arroubos, não tenho um “milhão de amigo”, e por minha saúde metal, quanto mais estou só, menos pessoas por perto, melhor. Aprendi a ser boa companhia para mim.
Dois beija-flores chegam na janela, bebem água em um bebedouro. Satisfeitos, batem suas preciosas asas, voam no tempo. Um bem-ti-vim canta estridente, superando o som da chuva.
O tempo, o tempo segue seu curso. Ontem criança, hoje homem feito, chego aos 65 anos, achando que uma das melhores coisas da vida é tranquilidade. A paz é algo que se constrói. O tempo constrói novos trilhos, e quando olho meus filhos, eles seguem sem mim. A realidade é mais que certa, temos a porta aberta, à nossa espera -quem já partiu. A nostalgia nos aperta, numa saudade que nos desperta, de um tempo que fugiu. Chove mais forte, Lenine canta “Paciência”:
“Mesmo quando tudo pede/Um pouco mais de calma/Até quando o corpo pede
Um pouco mais de alma/A vida não para/Enquanto o tempo/Acelera e pede pressa
Eu me recuso, faço hora/Vou na valsa/A vida é tão rara
Enquanto todo mundo/Espera a cura do mal/E a loucura finge
Que isso tudo é normal/Eu finjo ter paciência/O mundo vai girando
Cada vez mais veloz/A gente espera do mundo/E o mundo espera de nós
Um pouco mais de paciência/Será que é tempo/Que lhe falta pra perceber?
Será que temos esse tempo/Pra perder?/E quem quer saber?
A vida é tão rara/Tão rara/Mesmo quando tudo pede
Um pouco mais de calma/Até quando o corpo pede
Um pouco mais de alma/Eu sei, a vida não para/A vida não para não”.
Em oração peço ao bom Deus, paciência e sabedoria para seguir em frente.
Luiz Thadeu Nunes e Silva – Eng. Agrônomo, Palestrante, cronista e viajante: o latino americano mais viajado do mundo com mobilidade reduzida, visitou 151 países em todos os continentes da terra. Autor do livro “Das muletas fiz asas”.
Membro do IHGM, Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão. ABLAC, Academia Barreirinhense de Letras, Artes e Ciências – E-mail: luiz.thadeu@uol.com.br