Mais do que um hobby, observar aves promove saúde mental, educação ambiental e desenvolvimento turístico sustentável


O dia ainda desperta quando o primeiro canto rompe o silêncio. Não há buzinas, notificações ou pressa, apenas o som preciso de uma ave anunciando sua presença. Observar pássaros é, antes de tudo, um exercício de atenção. Um convite para desacelerar, respirar e olhar com mais cuidado para um mundo que sempre esteve ali, mas que nem sempre é visto. É nesse ritmo que o birdwatching, ou turismo de observação de aves, vem conquistando cada vez mais adeptos no Brasil.
Mais do que uma atividade turística, a prática propõe uma experiência sensorial e educativa, capaz de reconectar o ser humano à natureza e a si mesmo. Em trilhas, parques urbanos, reservas ambientais e áreas protegidas, observar aves transforma caminhadas simples em momentos de descoberta, aprendizado e encantamento.




O prazer de observar
O birdwatching consiste na observação de aves em seu habitat natural, com o auxílio de binóculos, câmeras fotográficas ou apenas a olho nu. A atividade pode incluir a identificação das espécies pelo nome popular e científico, o reconhecimento de cantos, o registro fotográfico e a compreensão dos hábitos de cada ave.
Apesar de estar associado a viagens e destinos naturais consagrados, o birdwatching é uma prática acessível. Pode começar no quintal de casa, em praças ou parques urbanos, usando apenas o celular. Essa simplicidade ajuda a explicar por que a atividade cresce no país e atrai públicos diversos, de fotógrafos e pesquisadores a curiosos em busca de bem-estar.
Segundo o guia especializado em observação de aves Gabriel Simões, o crescimento do birdwatching no Brasil está diretamente ligado às transformações recentes da sociedade.
“A pandemia foi uma experiência coletiva traumática. As pessoas passaram muito tempo confinadas e, quando esse período terminou, surgiu uma necessidade maior de reconexão com a natureza. A pauta ambiental também ganhou mais força nesse contexto, e a observação de aves encontrou espaço para crescer”, analisa.
Para ele, a prática também dialoga com um mundo cada vez mais acelerado. “Vivemos numa sociedade onde tudo é urgente. Observar aves exige o oposto: parar, controlar a respiração, dedicar tempo e atenção. É sair do nosso mundo e tentar compreender o mundo natural que nos cerca.”
Acessível e transformadora
Diferente de outras atividades de turismo de natureza, o birdwatching não exige preparo físico intenso nem equipamentos sofisticados. Caminhadas leves, geralmente em áreas abertas ou bordas de mata, facilitam a observação e tornam a experiência inclusiva.
Além dos benefícios físicos, como a prática de atividade ao ar livre, a observação de aves contribui para a saúde mental, ajudando a reduzir estresse, ansiedade e estimulando a atenção plena. O hábito também favorece o convívio social, o aprendizado contínuo e a formação de novas conexões entre os participantes.
Observar aves também é uma forma de contribuir para a ciência. Por meio de aplicativos e plataformas digitais, os praticantes registram avistamentos, fotos e sons que alimentam bancos de dados utilizados em pesquisas sobre migração, comportamento e conservação das espécies.
A observação de aves conecta o indivíduo a algo maior. Cada registro pode ajudar pesquisadores a entender o crescimento ou declínio das populações e a definir áreas prioritárias para conservação.


O papel do guia
Com quase duas mil espécies de aves registradas no Brasil, e mais de 700 catalogadas apenas no Tocantins, contar com um guia especializado faz toda a diferença.
“O guia atua como um tradutor do conhecimento científico. Ele ajuda as pessoas a entenderem como cada espécie se comporta, como responde ao ambiente e por que aquele local é importante para a conservação”, destaca Gabriel, que atua principalmente nos estados de Goiás e Tocantins.
Na prática, o profissional transforma dados técnicos em informação acessível, enriquecendo a experiência do visitante e fortalecendo a educação ambiental.


Destinos que encantam
O Brasil é considerado um dos principais destinos do mundo para o birdwatching, com experiências que variam de acordo com cada bioma.
Do Pantanal, onde a concentração de aves aquáticas impressiona, à Amazônia, com sua diversidade incomparável, passando pelo Cerrado, Mata Atlântica e áreas de transição ecológica, o país oferece cenários únicos para a prática.
No Tocantins, o Parque Estadual do Cantão se destaca por reunir espécies da Amazônia, do Cerrado e do Pantanal em um mesmo território — uma combinação rara que atrai observadores experientes e iniciantes.
No Maranhão, a Secretaria de Turismo aponta dois destinos especialmente interessantes para a prática: Alcântara, onde se destaca o pássaro Guará ou Scarlet Ibis; a Reserva Natural Cachoeira do Rio Cocal, no município de Riachão; o Parque Estadual do Mirador, o Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses e a Ilha de Cambristo (Baía de Cumã).
Texto: Seleucia Fontes
Edição: Gutemberg Bogéa















































































